Trecho retirado da palestra ministrada por Sofia Mountian na sede da ONG Solaris em maio de 2010.
O Caminho do Guerreiro é um percurso de realização por meio do próprio esforço e a partir do próprio desejo. O termo “Caminho do Guerreiro” vem do taoísmo, mas, na mitologia chinesa, o guerreiro é um ser que consegue ser vitorioso sem uma “espada” na mão: é um guerreiro pacífico. Ele atua com agressividade sem perder o foco naquilo que quer, mas não com o objetivo de matar. O Caminho do Guerreiro não é imediato, é um processo que possui 8 etapas ou estacas.
A 1ª estaca chama-se intensidade, a 2ª aceleração, a 3ª autoridade, a 4ª alívio, a 5ª convivência, a 6ª decisão, a 7ª provação, e a 8ª eternização. As estacas não têm tempo definido de ação, mas todas precisam ser superadas. Não há como chegar a uma das etapas, como à autoridade, por exemplo, e parar. O mais importante é ir até o fim, porque só assim a pessoa consegue impor aquilo que quer ao mundo, e, nesse momento, o mundo aceita isso, abrindo espaço para ela mudar o próprio destino. O Caminho do Guerreiro é o caminho para a mudança de destinos.
A primeira estaca, intensidade, consiste em desvelar a energia que o guerreiro precisa para começar seu caminho. Nosso dia a dia está repleto de afazeres. Quando a pessoa fala para si mesma: “Quero fazer isso por mim”, quase nunca acha tempo para tornar seu objetivo prioritário. Por outro lado, geralmente ela não sabe direito o que quer, desconhece seu verdadeiro desejo. Então, o Caminho começa dando destaque para si.
Inicialmente, deve-se fazer uma lista de atividades prazerosas, pequenas coisas, mas com a obrigação de repeti-la todos os dias. Essas atividades não devem ocupar muito tempo. O ideal é escolher 25 itens, mas pode-se começar com 10.
A segunda estaca, aceleração, consiste em acompanhar diariamente a execução dessa lista. Durante cerca de um mês, no fim do dia, é preciso verificar se os itens foram cumpridos ou não. Isso é difícil, porque a pessoa começa a se irritar ao perceber que não consegue realizar o que gosta, por mais que queira. Logo ela larga essas tarefas e volta sua atenção para outras coisas, e o Caminho é abandonado.
As primeiras duas estacas são muito importantes, pois abrem espaço para os objetivos. O indivíduo constata que não consegue realizar sozinho as atividades de que gosta e que precisa de ajuda profissional para realizar o que quer, pois agora ele sabe o que deseja.
Então chega a vez da 3ª estaca, a autoridade. É a estaca de contato com um profissional disposto a ajudá-lo, um médico, um psicólogo, um professor, de preferência alguém com experiência no problema em questão. Se alguém quer parar de fumar, por exemplo, não adianta procurar um médico que fuma sem parar. Depois de achar um profissional competente, inicia-se o tratamento. No entanto, essa é apenas a terceira estaca.
O tratamento está funcionando, a pessoa fica contente por não fumar mais, por não comer tanto, por não beber mais… Com isso, consegue manter a meta. Trata-se, pois, da 4ª estaca, alívio, que acontece num ambiente conhecido, no trabalho, na família, entre amigos, etc. No ambiente familiar, é possível manter o tratamento, pois não há muitas tentações. A pessoa se sente muito bem, orgulhosa por ter alcançado o objetivo.
Então chega-se à 5ª estaca, convivência, que é um momento fatal, pois é quando o sujeito se encontra fora do seu ambiente habitual. De repente, vai a uma festa, onde ninguém o conhece, onde ninguém se preocupa se está fumando ou não, e, como todo mundo lá fuma, ele não aguenta e começa a fumar também. Essa é uma etapa muito terrível, pois mostra que o desafio de manter o desejo não foi alcançado. E tudo parece voltar atrás. Mas não se deve desistir, pois é depois de perceber que o tratamento não trouxe estabilidade que vem a 6ª estaca, chamada decisão. Essa estaca exige uma definição clara do motivo de a pessoa estar fumando, bebendo, comendo, seja o que for. Nesse momento, o indivíduo resolve enfrentar seus karmas, seus diabinhos, e consegue entender o que realmente o impede de largar aquilo que racionalmente ele sabe que lhe faz mal. Surge a necessidade de se fazer uma investigação, de compreender, de observar aquilo que acontece dentro de si. Essa análise mexe tanto com pessoa que ela chega ao ponto de dizer: “eu ou meu vício”. Essa decisão revela que o entendimento é mais forte do que a emoção. Surgem, então, condições para uma nova realidade se enraizar, pois há compreensão, ação e motivação. É possível dizer que acreditar naquilo que foi compreendido desencadeia a ação, que traz um resultado concreto: motiva a pessoa a continuar.
A 6ª estaca traz o estímulo para agir, e a pessoa começa a gostar dessa ação, ou seja, começa a apreciar o próprio sacrifício. No início, gostamos daquilo que é prazeroso, mas na 6ª estaca começamos a gostar de sacrificar algo a nós mesmos. É diferente. Nem é preciso de remédio, porque o indivíduo está disposto ao sacrifício. Isso começa a trazer satisfação, pois, com essa motivação, ele vê o resultado conforme a sua compreensão, que é maior do que seu pensamento imediato. Acontece um salto de consciência, a pessoa compreende em todas as dimensões e realidades que a atitude que quer largar é prejudicial ao seu corpo. Suas células choram, seus órgãos choram. Nesse momento, houve uma melhoria significativa.
O sacrifício é enorme, porque vícios são sempre muito gostosos. Mas agora a pessoa não se sacrifica apenas em nome de sua personalidade, mas em nome de seu corpo, daquilo que está sob seu domínio e que também faz parte de sua existência. O sacrifício é transformado numa disciplina aceita e seguida à risca. É a 7ª estaca, chamada provação. Quando isso acontece, já se pode dizer ao mundo, e em voz alta: “Eu não fumo mais”.
Na 6ª estaca, nada é justificado, porque tudo foi entendido. Por isso na 7ª é possível afimar ao mundo que o objetivo se concretizou. Então o mundo responde: “Ah, não fuma? Não acredito. Pegue um cigarro”. Na 7ª estaca, a pessoa não fuma porque não quer. “Foi a um médico?” “Não, eu ia a um, agora não preciso mais, porque entendi que eu não quero mais fumar.” Aquilo que antes era uma grande fonte de prazer emocional deixou de ser. Houve a criação de uma disciplina e o entendimento de que isso não é mais necessário.
Na 8ª estaca, eternização, a pessoa é conhecida como aquela que parou de fumar, e as outras pessoas a veem como uma autoridade. A disciplina virou um hábito, que não precisa mais de esforço nenhum para ser concretizado. A motivação torna-se permanente. Não há mais sacrifício interior. Esse é o Caminho do Guerreiro.