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Ideia e informação

Em 22 de agosto passado, saiu na Folha de São Paulo um artigo muito interessante chamado “A elusiva grande ideia”, por Neal Gabler do The New York Times. Este artigo levanta a questão da escassez de grandes ideias. As ideias agora parecem menos significativas, e não por falta de inteligência, mas por falta de interesse e por certa preguiça de processá-las. Nossa cultura está cada vez mais visual, mais simplória, e não valoriza ideias que não sejam facilmente compreendidas. A grande vilã dessa escassez, segundo Gabler, é a informação.

Graças à internet, temos acesso imediato a qualquer coisa que queremos saber. Hoje podemos acessar com impressionante rapidez e sem esforço informações sobre qualquer assunto. Ao obtê-las, ficamos satisfeitos, achando que já entendemos suficientemente o assunto, e que não precisamos saber mais. A curiosidade cessa.

As informações estão em toda parte. Chegam até nós por diversos meios, sempre encontrando um campo fértil entre as pessoas. As informações valorizam ideias muito materiais, mesmo em se tratando de temas espirituais, filosóficos ou esotéricos. Além disso, são muito descartáveis, pois nós temos um determinado limite mental para processá-las. Não é possível segurar na nossa mente tudo o que a alcança, senão, nos tornamos pessoas sugestionáveis.

Pensemos um pouco nesse tema pela ótica da Teoria da Abrangência. Sabemos que a Comunicação é um processo, e, como tal, é dividido em 3 partes: Fonte de Conteúdo, Solução Prática e Troca de Informações.

A Fonte de Conteúdo é criativa e capaz de processar o conteúdo de ideias abstratas, não relacionadas com nada material e conhecido. O pensamento abstrato está sempre focado no inédito.  Ele lida com o desenvolvimento de novas ideias, com a criação de diversas alternativas, e com a capacidade de escolha dentre essas da que traz a melhor possibilidade de aplicação. O pensamento abstrato é muito valioso, exatamente por não existir em lugar nenhum. Por meio dele, surgem possibilidades de novas mudanças naquilo que existe. Nessa parte do processo, temos uma “fábrica de ideias inéditas”, cuja escassez, como vimos, é tão sentida nos dias de hoje.

A Solução Prática é dedicada a ideias materiais e que todas as pessoas entendem. Aqui prevalece o senso comum, com utilização prática e imediata, sem grande esforço mental. As ideias são concretas, e o pensamento muito mais compreensível e informativo. O pensamento concreto tem como característica principal a capacidade de síntese, envolvendo uma ideia bem definida e perfeitamente aplicável a determinado assunto, que é conhecido de todos. Há sempre um local material envolvido, que se reflete na nossa mente como uma forma mental familiar. Procuramos ligar a ideia a um padrão mental, facilitando ao máximo o seu detalhamento. O pensamento torna-se sedutor e leve, o que dispensa a necessidade de entender algo novo. No entanto, esse prazer passa rápido, pois esse pensamento, uma vez identificado, parece que se esvai da cabeça, a não ser quando juntamos a ele o desejo de possuir aquilo que a informação promete. Nesse caso, começamos a premeditar o futuro, vivendo no mundo imaginário que desejamos concretizar. As informações que nos bombardeiam de todo lado vêm ao encontro desse mundo imaginário. Nele existe sempre a possibilidade de possuir o que é desejado. Então corremos para comprar um brinquedo novo, um pacote de viagem, uma reserva no restaurante, etc. O pensamento concreto corresponde ao mundo material de ideias e de informações existentes.

A Troca de Informações, a terceira parte do processo, é livre, variada e informal, com informações passadas e repassadas continuamente. Aqui todos são iguais, não há ninguém superior; há um diálogo, um debate, uma discussão − perguntas e respostas para saber do que se trata a questão, sem soluções nem sugestões. O objetivo dessa conversa será sempre a troca. Esse momento do processo, por ser livre, é capaz de introduzir a informação isenta de censura. Tudo é permitido. No entanto, nesse intercâmbio, surge um embate entre o pensamento abstrato e o concreto. É muito mais fácil passar uma informação material, de compreensão clara e rápida, do que algo novo, que contém uma ideia inédita.

A arte de comunicação consiste na fusão dos dois tipos de pensamento. Isoladamente, nenhum dos dois tem vida longa na mente das pessoas. A ideia abstrata não se fixa, pois exige muito para o seu processamento. Já a ideia concreta, material, é tão facilmente compreendida quanto esquecida, pois logo surge outra informação mais interessante para ocupar seu lugar.

O segredo é conseguir fazer com que a ideia abstrata seja expressa numa linguagem comum e numa forma visual capaz de ser entendida. Nesse contexto, surge algo fantástico, que é a curiosidade intelectual, impulsionando buscas e conhecimentos.

O artigo aqui citado trouxe exemplos de algumas ideias abstratas em roupagens leves e chamativas − como a “Teoria do Big Bang”, o “Deus morreu?” ou “O fim das Ideologias” − que transformaram os cientistas ou os filósofos em celebridades. A discussão desses assuntos eleva o nível intelectual e abre novos campos mentais. As mentalidades se expandem e ficam mais abertas para o novo, inclusive, no caso de mudanças pessoais.

Toda vez que se quer introduzir uma nova ideia, é importante criar uma forma de pensamento que traga alguma referência material, e, com isso, a ideia terá uma aplicação prática. O resultado conjunto será: uma informação de conteúdo intelectual valioso, capaz de ser captado e lembrado.

Sofia Mountian
Sofia Mountian dispensa maiores apresentações – criadora da Teoria da Abrangência, fundadora do Instituto Solaris, presidente da ONG Solaris e uma das sócias da Plênita Consultoria. Sofia, no intuito de esclarecer dúvidas sobre a Teoria da Abrangência, o crescimento do ser humano e assuntos de interesse dos solarianos, escreve mensalmente na Revista Solaris.
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