Outro dia fiz um passeio maravilhoso pela UCLA, provavelmente a faculdade mais famosa de Los Angeles. Fica numa vizinhança muito charmosa, Westwood. Estava uma tarde deliciosa. Conheci as irmãs Giselle e Charlotte, donas de uma joalheria parecida com um conto de fadas, comprei um brinco de turquesa. Conheci o Café Profet, visitei uma loja de fantasias para Halloween, escolhi minha fantasia, vai ser show, e encontrei uma escola de canto. Deparei com um cinema, o cinema do Once Upon a Time in Hollywood, filme fantástico do Quentin Tarantino no qual a personagem interpretada pela Margot Robbie, a Sharon Tate, vai assistir ao próprio filme. Entrei. Passava o último filme do Kenneth Branagh, mais uma história de Agatha Christie, já o terceiro livro dela que ele dirigi para o cinema.
Não gostei do A Haunting in Venice, achei a Tina Fey maravilhosa. Foi o cinema em si que amei, o Regency Bruin Theater. Fundado em 1936, é um dos cinemas mais antigos de Los Angeles. 1938 foi o ano em que meu pai nasceu. Na galeria de fotos, tinha de tudo, estreias, a vizinhança ao longo dos anos. Uma das maiores estreias foi em 1946, o ano que minha mãe nasceu. Pensei nos meus pais. Lembrei de um outro filme do Branagh, que adorei, o Dead Again. Conta como as pessoas se reencontram, vida após vida, e como cada vida tem resquícios da vida passada. Imaginei meus pais em Veneza cerca de 1880. Meu pai era cantor de ópera — ele adorava cantar —, minha mãe era dançarina — ela adorava dançar. Se conheceram no teatro em que trabalharam, eles se conheceram numa loja de discos. Ele se apaixonou por ela à primeira vista. Cantou debaixo da janela dela à beira de um canal, escreveu música para ela, mandou flores e conquistou a bela. Se casaram numa gôndola. Deu para ela um colar de turquesa como jura de amor. O dono do teatro ficou furioso, pois também estava apaixonado por ela — minha mãe era popular. Recém-casados, eles fugiram de Veneza, vieram para a América, “heck yeah”. O dono do teatro lançou uma praga no casal. O navio deles quase afundou. Naufragaram em Cuba. Chegaram em Nova Iorque de veleiro, não passaram pela imigração. Ilegais, minha mãe dançou em teatros no Lower East Side. Conseguiram a cidadania graças às pernas dela. Ela virou estrela da Broadway, super star com estreias com holofotes e casacos de pele — ela vendia casacos de pele. Meu pai adoeceu e morreu, de ciúmes.
Achei este roteiro bem mais interessante do que o do filme que vi. Mais interessante até mesmo do que o livro que meu pai escreveu para minha mãe — sorry, dad — Dança, Carmela, Dança.