Dois ideogramas, ORU (dobrar) e KAMI (papel), compõem o termo ORIGÂMI, que foi adotado internacionalmente no séc.20 para designar essa arte, mesmo havendo outros nomes locais. Através de dobras e do uso intrínseco da geometria, a arte do origami transforma um pedaço de papel, normalmente em forma quadrada, em representações tridimensionais de animais, plantas, brinquedos, formas geométricas, objetos decorativos, joias, utilitários, enfim, em peças de extrema simplicidade ou de altíssima complexidade.
Um pouco de história
Pelo Japão ter sido um dos maiores divulgadores do origâmi, muitos atribuem a origem da técnica a ele, mas, na verdade, ela está associada à China, onde surgiu o papel, que tomou o lugar da seda como suporte de escrita. O conhecimento do papel foi levado ao Japão no início do séc.6 por monges budistas, tanto por meio das escrituras sagradas quanto pela própria disseminação da técnica de sua feitura. Assim, inicialmente o origâmi se restringia ao sagrado, o que, no entanto, não foi de todo abandonado. Os templos xintoístas, por exemplo, para demarcar áreas sagradas, continuam usando cordas de palha de arroz em que se pendem quadrados de papel branco em zigue-zague.
Depois, origâmis específicos passaram a ser usados em solenidades, como funerais e casamentos, e sobre regalos para expressar boa sorte. O alto custo do papel limitava sua prática aos adultos, e seu uso recreativo posterior à nobreza.
No séc.18 apareceram modelos de origâmis em padrões de quimonos e em gravuras, além de livros com diagramas, como o famoso Sembazuru Origata. Feito já no fim dos setecentos, esse livro mostra mil maneiras de dobrar tsurus (a ave-símbolo do origami) – dezenas de tsurus podem ser feitos (sem cola) com apenas um pedaço de papel!
No Ocidente, o origâmi parece ter seguido um desenvolvimento paralelo ao do Japão. Nas incursões chinesas pelo mundo, o papel e o origami foram levados aos árabes, alcançando o Egito no séc.10 e, através dos mouros, a Espanha no 12, de onde se deu a disseminação pela Europa no séc.14.
Na Alemanha, entre os séculos 18 e 19, F.Fröebel introduziria o kindergärten (jardim de infância) no sistema educacional e com ele a dobradura como parte do programa, assim como aconteceu no sistema educacional japonês no fim do séc.19.
A disseminação do origâmi aconteceu ao longo dos séculos de forma espontânea. Os modelos e conhecimentos tradicionais eram passados de geração a geração em anonimato, contrariamente ao que ocorre na modernidade, em que o destaque maior está no nome do criador, que é detentor de sua ideia e de todas as questões decorrentes dela (direitos autorais/copyright, propriedade intelectual, etc.).
O origâmi e o cérebro
O origâmi tem sido foco de atenção de neurocientistas. A atividade bimanual assimétrica, coordenada e direcionada utiliza e potencializa a habilidade de coordenação (mão/olho), a observação, a motricidade fina, a relação espaço-visual, a leitura de códigos, a memória sequencial, a percepção e discriminação de forma, tamanho e posição; facilita a organização cerebral no aspecto da plasticidade; e ativa ambos os hemisférios cerebrais e a interação entre eles. Os reflexos da prática do origâmi se revelam com sucesso no aprimoramento de habilidades cognitivas e criativas, ativando o cérebro como um todo e influindo, inclusive, em áreas cerebrais que atuam na linguagem.
O origâmi moderno
Atualmente, o desenvolvimento do origâmi é um híbrido oriental-ocidental, indo muito além de um simples passatempo. A medicina, a matemática, as ciências da computação, as indústrias de alta tecnologia, como a automobilística, a aeroespacial e a eletrônica, estão entre algumas das áreas que usam as técnicas do origâmi para resolver questões muito complexas, como dobrar e acondicionar telescópios espaciais, alocar painéis solares em satélites, e criar airbags e stents. A utilização ampla da técnica do origami foi possibilitada por Yoshizawa, que criou uma linguagem internacional de regras de dobradura, facilitando a comunicação de diversas áreas do conhecimento. Com os códigos e os padrões de Yoshizawa, as técnicas são passadas quase sem a necessidade de palavras, por isso seu conhecimento independe da língua de chegada.
Assim, entre os adeptos do origâmi, achamos artistas, cientistas e terapeutas, que o usam na recuperação de seus pacientes (tanto em problemas neuromotores quanto no estresse). O origâmi é de fato um método inovador, pois promove o desenvolvimento lúdico de várias habilidades do ser humano.
David Lister, em seu texto sobre origami e espiritualidade, cita Eric Kenneway, que em minha tradução livre diz: “para alguns origamistas, a unicidade do quadrado de papel (que tem a capacidade de se tornar todas as criaturas interdependentes, já que o quadrado sempre se mantém um quadrado), simboliza a crença na harmonia do universo e na presença da natureza búdica em todas as coisas”.
Ao longo do mês de julho de 2012, Toshiko Hama, pela quarta vez, ministra uma oficina de origami no Museu do Futebol no Estádio do Pacaembu (“Férias no Museu”), de quinta a domingo, das 10 às 17h (não é preciso marcar um horário, basta comparecer).
(A imagem acima traz origâmis de Toshiko.)