Ela ia abrir a porta mas parou. Sentia dor.
Parou. Respirou.
Esperou e rezou.
Rezou devagar como se cantasse um mantra, “Ave Maria, cheia de…”.
A dor passou, ela abriu a porta.
Ele não estava.
Claro.
A sala de estar continuava a zorra de sempre.
A zorra era tão normal que ela o chamava de Zorro. E suspeitava que ele tinha uma vida dupla, que saía mascarado pela rua pelas noites, pelos bares, pelas pernas. Olhou para a direita.
Senhor.
Sentiu um tremor; a porta do quarto dele estava fechada.
“Oi!”
Ela deu um salto.
Era o irmão do Zorro, o Zorrito.
“Tudo bem? Que quieta, nem te ouvi entrar…”
Ela sorriu, fingiu estar bem e abriu a porta do quarto do Zorro.
A cama desfeita, roupas para todo lado, a porta para a varanda aberta, o sol entrava.
“Cadê o seu irmão?”
“Não sei. Pensei que estivesse aqui.”
“Liguei para ele seis vezes e nada.”
O irmão ligou para o Zorro. Sem sucesso.
“São 2 da tarde, ele não voltou para casa?”
“Não sei dizer, Dirce.”
“Estou preocupada.”
“Vou ligar para o Paulo, eles jantaram ontem.”
Ligou. Paulo não respondeu.
Sentaram, apreensivos.
A dor voltou.
“Vamos assistir ao The Office?”
“Vamos.” Ela reclinou a poltrona. A dor continuou.
Quando deram 8 da noite, eles ligaram para a delegacia.
“Se o fulano não voltar pela manhã, volte a nos chamar.”
Eram 8 e meia da noite quando Zorro voltou. Mascarado, com litros de cerveja. Ela suspirou. A dor passou. E terminou a noite jogando pôquer com Zorro e Zorrito.