“Passamos!”
“Passamos! Por que não parou?”
O trem chacoalhava. Nós dois com a cara grudada na janela da porta, o trem vazio, lá fora, noite.
“Onde vai parar, agora?”
Meu namorado estudou o boletim de horário, “putz, em Dana Point”.
Risos. “Vamos atrasar…”
Era Dia dos Namorados e meu namorado me levava para um jantar surpresa, vamos de trem – ele havia me dito. “Opa, legal!”
Em Dana Point a espera para o táxi era de mais de uma hora. “Tem ônibus”, ele me disse. “Ok, vamos de ônibus.” De cara achei o motorista estranho. Éramos eu, meu namorado e uma mocinha de passageiros. O motorista fazia perguntas, nos encarava pelo espelho retrovisor, a estrada ficava mais escura, cheia de curvas, acentuando as perguntas irritantes do fulano.
“Onde este ônibus para?”, perguntei.
“Num posto de gasolina”, disse ele.
De repente, o ônibus parou. Entrou um soldado armado com um fuzil, arregalei meus olhos. “Estamos atravessando uma base militar”, meu namorado cochichou. O soldado pediu nossos documentos, revistou o ônibus e sumiu.
Demorou, mas chegamos no posto. O motorista nos deu boa-noite e, pouco depois, desapareceu. O posto era um posto fantasma, perdido no tempo. “Motorista salafrário, louco, largar a gente aqui!”
Nossos celulares não tinham sinal.
A uns metros, o portão da base militar estava trancado.
“Como nós vamos sair daqui?”
“Tem um atalho”, a mocinha disse. Apontou para o lado.
“Onde tem aquela placa dizendo ‘cuidado: campo minado’?”
“Sim.”
Eita, um Dia dos Namorados aventureiro. Seguimos pelo atalho, chegamos na estrada de terra do lado de fora. De imediato, como um encontro marcado, dois fachos de luz fizeram uma quebrada ao longe e começaram a vir em nossa direção… meu coração disparou. Sabia exatamente a cena do filme de gângster na qual havia visto essa imagem. Os fachos se aproximando…
Era o pai da menina, um soldado.
O jantar foi ótimo, com duas horas de atraso e luz de velas.